sábado, 29 de junho de 2013

Tratado de Marrakesh: momento histórico dos Direitos Autorais

Benny Spiewak*

A assinatura do Tratado de Marrakesh representa um momento histórico para o sistema dos Direitos Autorais. Assinado em 28 de junho no Marrocos, o tratado internacional facilitará e tornará livre de impedimentos, sob a ótica dos direitos autorais, o processo para que obras literárias sejam adaptadas para o sistema braile e outros sistemas que permitem a absorção por portadores de necessidades visuais específicas.

Baseado na lei brasileira de direitos autorais e outras legislações Latino Americanas, o Tratado resultou de quase uma década de trabalhos junto à Organização Mundial da Propriedade Intelectual, em Genebra, Suíça. O ato aconteceu na cidade de Marrakesh, Marrocos, durante conferência da Organização Mundial da Propriedade Intelectual, formada por 186 países.

O novo tratado ilustra um momento especial de harmonização entre os Direitos Humanos e os Direitos da Propriedade Intelectual, bem como e especialmente, destaca a capacidade e liderança brasileiras nas questões discutidas no âmbito da Organização Mundial da Propriedade Intelectual.

Mais do que isentar os formatos excepcionais do pagamento de royalties, o Tratado de Marrakesh reconhece a importância da participação da sociedade civil organizada na formação de processos legislativos internacionais. A iniciativa do tratado, que resulta de quase uma década de discussões, foi lançada por associações de portadores de limitações visuais, as quais pautaram, instruíram e pressionaram os governos a discutir o tema, finalmente aprovando-o.

Como regra, obras literárias são protegidas pelo sistema autoral, para que haja um equilíbrio entre o acesso à informação e a justa remuneração do autor e dos gestores da obra. Ocorre que algumas exceções à essa regra existem. A lei brasileira, desde 1998, entende que é livre, ou seja, não ocorrerá em violação aos direitos autorais, a adaptação de obras literárias impressas em formatos padrão para modelos acessíveis aos indivíduos com capacidade visual limitada ou inexistente, como os formatos com fontes maiores ou impressas no sistema braile.

O Brasil sempre defendeu a tese de que a encontrava base legal internacional, especialmente pela Convenção de Berna. Essa Convenção estabelece que os Países poderiam estabelecer exceções às regras autorais desde que elas ocorressem em casos específicos, que não impedissem ou prejudicassem substancialmente a exploração da obra através de outros meios e, ainda, que não causassem prejuízos indevidos aos titulares de direito. Ocorre que a exceção brasileira era regional, não alcançando outros territórios.

Com o Tratado de Marrakesh, a Organização Mundial da Propriedade Intelectual incorpora esse conceito de exceção em um documento internacional. Assim, os países que escolherem ratificar o Tratado terão incorporadas, em suas legislações autorais locais, a exceção para os chamados VIPs – Visually Impaired People, ou indivíduos com limitações visuais.

Nos últimos dias, inclusive, uma situação inusitada ocorreu. O cantor e compositor Stevie Wonder clamou aos negociadores que atingissem o consenso, garantindo que, na hipótese de conclusão do Tratado, ele se apresentaria em Marrakesh, em um pequeno concerto. Sorte dos ali presentes, que puderam aproveitar uma belíssima apresentação. Stevie Wonder chegou a Marrakesh na manhã de 28 de junho, dia da assinatura. De fato, há muito o que se comemorar.


* Benny Spiewak é advogado, sócio responsável pelas áreas de Defesa, Propriedade Intelectual, Life Sciences e Tecnologia do escritório ZCBS – Zancaner Costa, Bastos e Spiewak Advogados, especialista em Propriedade Intelectual e Tecnologia pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP), especialista em Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia pelo The Franklin Pierce Law Center (Concord, EUA) e mestre em Direito da Propriedade Intelectual (LLM), formado pela The George Washington University.

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